Artigos
Quais os antidepressores preferenciais em pessoas tratadas com tamoxifeno?
- Breves Questões Terapêuticas
|
O tamoxifeno é um modulador seletivo dos recetores de estrogénios utilizado no tratamento adjuvante do cancro da mama positivo para recetores hormonais,1-3 proporcionando reduções muito acentuadas na recorrência do cancro da mama e na mortalidade a ele associada.1,2,4
A depressão e a ansiedade são comorbilidades comuns em pessoas com cancro da mama,1,2 estimando-se que 20-30% das pessoas tratadas com tamoxifeno recebam simultaneamente um antidepressor.1,5
O tamoxifeno é um profármaco que é extensamente convertido a metabolitos ativos de maior potência pela isoenzima 2D6 (CYP2D6) do citocromo P-450.1,2,4-6 Estes incluem o 4-hidroxi-N-desmetiltamoxifeno (endoxifeno) e o 4- hidroxitamoxifeno. As concentrações séricas do endoxifeno são 6-10 vezes superiores às do 4-hidroxitamoxifeno,1,3 sendo aquele por isso considerado o metabolito clinicamente mais importante para a atividade do tamoxifeno.1
São vários os fatores que influenciam o metabolismo do tamoxifeno, incluindo polimorfismos genéticos e uso concomitante de inibidores da CYP2D6.5 Diversos inibidores seletivos da recaptação da serotonina (ISRS) e inibidores da recaptação da serotonina e noradrenalina (IRSN) inibem a atividade da CYP2D6 em diferentes graus,1,2,5,6 o que potencialmente previne a formação dos compostos ativos podendo, assim, reduzir a eficácia clínica do tamoxifeno.1,4,5
Dos ISRS, a paroxetina é um inibidor potente e a fluoxetina é um inibidor moderado a potente da CYP2D6.1,2 A fluvoxamina é um inibidor moderado,1 e o citalopram, o escitalopram e a sertralina são inibidores fracos.1,4 Apesar de a maioria das fontes considerarem a sertralina como um inibidor fraco da CYP2D6,2 alguns consideram-na um inibidor moderado;3 o seu efeito inibidor parece estar relacionado com a dose.2 Quanto aos IRSN, a duloxetina é um inibidor moderado e a venlafaxina é um inibidor fraco.1-4
A importância desta interação permanece controversa, porque a farmacocinética do tamoxifeno envolve outros processos além da CYP2D64 e, por outro lado, porque a relação entre a atividade da CYP2D6 e os resultados clínicos nas pessoas tratadas com tamoxifeno é inconsistente.1,4 Adicionalmente, os dados epidemiológicos são contraditórios e inconclusivos.1,2 Estudos observacionais3,4 e uma recente revisão sistemática5 não encontraram evidência consistente de que o uso concomitante de tamoxifeno e antidepressores esteja associado a resultados clínicos adversos.
É muito difícil, porém, descartar ou comprovar a relevância desta interação, devido aos diversos outros fatores que podem influenciar o resultado clínico,4 bem como ao longo período de latência para a sua identificação, o que dificulta a atribuição de causalidade. Ao contrário da maioria das interações, as eventuais consequências desta são desfasadas no tempo por um intervalo de anos, manifestando-se como falha de tratamento,2,4 sendo que o período de seguimento é frequentemente demasiado curto para identificar diferenças na sobrevida.2
Dada a plausabilidade biológica do mecanismo desta
interação,1,2 a gravidade das potenciais consequências da falha do
tratamento e a sua manifestação diferida,2,4 juntamente com a
relativa facilidade de mitigação deste risco,4 tem vindo a ser recomendado
que pessoas tratadas com tamoxifeno não recebam concomitantemente inibidores
fortes1,2,4 ou moderados da CYP2D6,1,2 o que vai ao
encontro das recomendações da maioria das normas de orientação terapêutica –
evicção de inibidores potentes e precaução com os restantes.5
Em resumo:
- A utilização de antidepressores ISRS ou IRSN em pessoas tratadas com tamoxifeno deve ser criteriosa,4 com a seleção preferencial de fármacos com fracos efeitos inibitórios sobre a CYP2D6, nomeadamente o citalopram, o escitalopram, a venlafaxina1-4,6 e a sertralina.1,4,6 Não pertencendo a estes grupos, a mirtazapina é também uma opção.2
- O uso concomitante de antidepressores que sejam inibidores potentes ou moderados da enzima CYP2D6 deve ser evitado sempre que possível.1-4 Estes incluem a paroxetina, a fluoxetina,1-4,6 a fluvoxamina,1 e a duloxetina.1,3,4 Não pertencendo aos grupos citados, o bupropiom deve igualmente ser evitado.3,4
Referências bibliográficas
1. Tamoxifen and SSRI or SNRI antidepressants – is there an interaction?
Eimear Maguire, Senior Medicines Information Pharmacist, North West Medicines Information Centre · Published 15 February 2019 [acedido a 13-12-2021]. Disponível em:
2. Safety Alert. Potential for Significant Drug Interaction: Tamoxifen & SSRI/SNRI Antidepressants. Irish Medication Safety Network. Version 1 Publication Date: 1st May 2019 [acedido a 13-12-2021]. Disponível em: https://imsn.ie/wp-content/uploads/2019/11/TamoxifenSSRIA2019.pdf
3. Aguiar CCT, Aguiar JVA, Rocha MG. Treatment of Depression in Patients under Breast Cancer Therapy: Antidepressant-Tamoxifen Drug Interactions. J Drug Metab Toxicol. 2017; 8(2): 228. doi:10.4172/2157-7609.1000228
4. Juurlink D. Revisiting the drug interaction between tamoxifen and SSRI antidepressants. BMJ. 2016 Sep 30; 354: i5309. doi: 10.1136/bmj.i5309.
5. Bradbury M, Hutton B, Beltran-Bless AA, Alzahrani M, Lariviere T, Fernandes R, et al. Time to Update Evidence-Based Guideline Recommendations About Concurrent Tamoxifen and Antidepressant Use? A Systematic Review. Clin Breast Cancer. 2021 Oct 9: S1526-8209(21)00294-9. doi: 10.1016/j.clbc.2021.10.003.
6. Banco de Preguntas Preevid. Antidepresivo de elección en pacientes con cáncer de mama en tratamiento con tamoxifeno. Murciasalud, 2019 [acedido a 13-12-2021]. Disponível em: https://www.murciasalud.es/preevid/22976
A Ordem dos Farmacêuticos disponibiliza informação cientificamente validada sobre medicamentos, dispositivos médicos e outros produtos de saúde, bem como ligações para outras informações de saúde publicadas por fontes idóneas e credíveis. Este conteúdo foi produzido para profissionais de saúde. Em caso de dúvida, fale sempre com o seu farmacêutico ou médico assistente.