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Quais os riscos associados ao uso de valproato durante a gravidez?

  • Breves Questões Terapêuticas
22 Fevereiro 2022
Quais os riscos associados ao uso de valproato durante a gravidez?


 
  • O valproato e o ácido valproico estão reconhecidamente associados a efeitos teratogénicos.
  • As autoridades de saúde estabeleceram restrições ao uso e um programa de prevenção da gravidez em mulheres em idade fértil.
  •  O farmacêutico deve assegurar, no ato da dispensa, o reforço da informação sobre os riscos e a sua mitigação.

O valproato e o ácido valproico (em diante designados somente por valproato) são fármacos anticonvulsivantes utilizados no tratamento de diversos tipos de doenças e síndromes convulsivas e no tratamento da doença bipolar.1,2 Nalguns países, como Portugal, está também aprovado para a prevenção da enxaqueca.3

O valproato é teratogénico, podendo causar malformações congénitas e perturbações graves do desenvolvimento neurocognitivo e psicomotor durante a infância.4-6 Foi introduzido no início dos anos 70 do século passado,1,2 e no final desta década já haviam sido publicados 10 estudos que indicavam um maior risco de malformações congénitas comparativamente a outros anticonvulsivantes. No final da década de 80 começaram a ser reportados casos de atrasos do desenvolvimento e autismo em crianças com exposição intrauterina ao valproato.1 Tanto o risco de malformações congénitas,1,4-6 como o de alterações do desenvolvimento, são dependentes da dose, não se tendo estabelecido um limiar de dose abaixo do qual os riscos sejam inexistentes.1,5,6

 

Mais detalhadamente, os riscos associados ao uso de valproato durante a gravidez consistem em:

Malformações congénitas – O risco é de cerca de 10% (1 em cada 10 bebés),1,2,6 face ao risco de 2-3% da população em geral. Os tipos mais comuns de malformações incluem defeitos do tubo neural (espinha bífida), dismorfia facial, fenda palatina e labial, craniossinostose, defeitos cardíacos, urogenitais,1,2,5,6 como hipospadias,1 e renais,2,6 defeitos nos membros,1,2,5,6 incluindo aplasia bilateral do rádio1,5,6 e polidactilia, atresia anorretal,1 e múltiplas anomalias envolvendo diversos sistemas. A suplementação com ácido fólico pode diminuir o risco geral de defeitos do tubo neural, mas existe evidência de que não reduz os riscos associados à exposição intrauterina ao valproato.2,5,6  

Transtornos do desenvolvimento – O risco é de 30% a 40%1,5,6 (3-4 em cada 10 bebés).  Incluem atrasos no desenvolvimento precoce, como falar ou andar mais tardiamente, menor coeficiente intelectual,1,2,4-6 menores capacidades de linguagem (fala e compreensão), problemas de memória,1,4-6 risco aumentado de autismo, transtornos do espetro autista e transtorno de hiperatividade com défice de atenção,1,2,4-6 dificuldades de adaptação comportamental, diminuição estatisticamente significativa no desempenho escolar4 e maior necessidade de apoios educativos especiais.1

 

Em 2014, foram reforçados os alertas de segurança na União Europeia, com a contraindicação do uso em grávidas, crianças do sexo feminino ou mulheres em idade fértil, a menos que inequivocamente necessário.1,2 Em 2017, após constatar que as medidas adotadas em 2014 haviam sido insuficientes,1 o Comité de Avaliação do Risco de Farmacovigilância (PRAC) da Agência Europeia do Medicamento (EMA) recomendou um reforço das contraindicações e a implementação de um plano de prevenção da gravidez,1,2 que terá de ser cumprido em mulheres em idade fértil, e que inclui o aconselhamento sobre os riscos e a necessidade de utilizar contraceção eficaz durante todo o tratamento.1 Algumas fontes explicitam que esta deve consistir na utilização de um método contracetivo altamente eficaz, de preferência independente do utilizador, ou de dois métodos complementares de contraceção, incluindo um método de barreira.2,6

As recomendações do PRAC resultaram na adoção de medidas pelas agências do medicamento dos estados-membros, como foi o caso do Infarmed que, em 2018, emitiu uma Circular Informativa que detalha as novas medidas a implementar.3 Estas incluem:

- Proibição do uso durante a gravidez para prevenção da enxaqueca ou tratamento do transtorno bipolar;

- Proibição durante a gravidez no tratamento da epilepsia, exceto se não existir outra alternativa terapêutica;

- Não utilização em mulheres em idade fértil, exceto se forem cumpridas as condições de um programa de prevenção da gravidez;

- Iniciação do tratamento em mulheres somente se não existir alternativa terapêutica, incluindo em raparigas antes da puberdade.

 

Em 2020, o Infarmed publicou nova Circular Informativa, na qual realça a intervenção do farmacêutico comunitário.7 No ato de dispensa de medicamentos contendo valproato, o farmacêutico deve:

- Reforçar às raparigas ou mulheres em idade fértil a informação acerca dos riscos do uso do valproato durante a gravidez2,6,7 e assegurar que estas recebem o cartão para a doente2,5-7 e compreendem o seu conteúdo;5,7

- Verificar que a embalagem de valproato contém o aviso exterior;7

- Enfatizar a necessidade de uma contraceção eficaz;2,6,7

- Informar da necessidade de continuar a tomar valproato, mas consultar o médico imediatamente se está a planear uma gravidez, ou suspeita estar grávida;2,5,7

- Salientar a importância da revisão anual do tratamento por um médico especialista.2,5,6


Referências bibliográficas

1. Valproico y Embarazo: un problema para la reflexión. INFAC. 2018 [acedido a 25-01-2022]; 26(3): 19-26. Disponível em:  http://www.euskadi.eus/contenidos/informacion/cevime_infac_2018/es_def/adjuntos/INFAC_Vol_26_n3.pdf

2. Eustace V, Jones S, Yates G, O’Neill G. Valproate use in women: minimising the risks. The Pharmaceutical Journal. December 2020; 305(7944): DOI:10.1211/PJ.2020.20208271.

3. Valproato e Ácido Valproico – novas medidas para evitar exposição na gravidez. Circular Informativa Infarmed N.º 054/CD/550.20.001. Data: 29/03/2018 [acedido a 25-01-2022]. Disponível em:

https://www.infarmed.pt/documents/15786/2409571/Valproato+e+%C3%81cido+Valproico+-+novas+medidas+para+evitar+exposi%C3%A7%C3%A3o+na+gravidez/8674040d-5633-46c5-90ab-0e341f8c8b61?version=1.1

4. Acide valproïque: les conséquences d’une exposition in utero, en bref. Rev Prescrire. 2019; 39(430): 589-90.

5. Riesgos del uso de valproato durante el embarazo y Programa de Prevención de Embarazos - Guía para profesionales sanitários. Agencia Española de Medicamentos y Productos Sanitarios, febrero 2021 [acedido a 25-01-2022]. Disponível em: https://cima.aemps.es/cima/DocsPub/15/2327

6. Guide for Healthcare Professionals - Information on the risks of Valproate use in girls (of any age) and women of childbearing potential. Medicines & Healthcare products Rugulatory Agency, November 2020 [acedido a 25-01-2022]. Disponível em:

https://assets.publishing.service.gov.uk/government/uploads/system/uploads/attachment_data/file/950802/107995_Valproate_HCP_Booklet_DR15_v07_DS_07-01-2021.pdf

7. Medicamentos contendo valproato e ácido valpróico – cartão para a doente. Circular Informativa Infarmed N.º 049/CD/550.20.001. Data: 07/02/2020 [acedido a 25-01-2022]. Disponível em:

https://www.infarmed.pt/documents/15786/3464130/Medicamentos+contendo+valproato+e+%C3%A1cido+valpr%C3%B3ico+%C2%BF+cart%C3%A3o+para+a+doente/ace100bc-f907-85a3-15ee-bb15cb0ecfd9

 

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